terça-feira, 23 de outubro de 2012

A CHAPA ESQUENTOU. TIREM AS CRIANÇAS DA SALA!

Na reta final o que vale é a paixão...


Exausto leitor, vamos respirar fundo, contar até dez, que a eleição é logo ali.

Se alguém reclamou de um primeiro turno modorrento, eis que a atual fase da peleja nesta freguesia nos reservou fortes emoções em ambos os lados adversários.

Adolfo Konder (PDT), do alto de seus 17 pontos de vantagem no primeiro turno (obteve 42 contra 25 de Mulim) entrou, mesmo sem querer, numa perigosa zona de conforto, artificialmente ampliada após a adesão natural do PMDB estadual à campanha pedetista, mesmo desfalcado da candidata derrotada Graça Matos. Quem acompanha o blog sabe que já tratei do quadro de alianças antes e depois do primeiro turno. Konder, que já tinha os apoios no município e do governo federal, festejou, em grande júbilo, a conquista da "tríplice aliança" com a entrada entusiasmada do governo do estado na campanha.

As movimentações pedetistas deixaram Neilton Mulim (PR) isolado, sendo obrigado a se servir do que tinha à mão no mercado eleitoral gonçalense: a composição política com o presidente da Câmara, Eduardo Gordo, e mais 11 vereadores, entre atuais e eleitos. Uma movimentação que envolve, além de espaço no governo, a presidência da Câmara numa hipotética reeleição de Eduardo Gordo, que ainda espera julgamento no TSE.

A aliança Mulim-Gordo não foi bem digerida por parcela do eleitorado, e mesmo antes do lado de lá soltar o primeiro rojão para comemorar o tiro no pé do adversário, eis que surgem fatos logo explorados como políticos pela candidatura Mulim na conta da campanha pedetista. Primeiro, materiais de campanha do PR são destruídos por supostos vândalos à serviço da candidatura Konder. Depois, funcionários comissionados (políticos) da prefeitura são flagrados (sic) fazendo política (sic) para o candidato do governo. Bom, não resisto a um comentário: é como um moralista reclamar da paisagem de uma praia num lindo dia de sol...

Coisas de campanha, amado leitor. Nenhum vândalo foi pego e até agora nenhuma moça foi presa por atentado ao pudor, e, se fato ou factóide, o burburinho repercutiu na imprensa, televisão e, claro, nas redes sociais. Se era porco ou tomada, não sabemos. O caso criou uma cortina de fumaça no eleitorado ao mesmo tempo que serviu de antídoto contra qualquer investida pedetista à aliança construída por Mulim com o presidente da Câmara.

***

ECOS DO DEBATE

Foi ruim, morno e pouco esclarecedor. Mas registre-se o papel importante da OAB que desde 2008 se esforça em participar cada vez mais do dia a dia da cidade. Parabéns aos outros organizadores também.

Farei um resumo em cima daquilo que acho mais importante: como governar uma cidade enorme, com tantos problemas e com um orçamento baixíssimo para uma população como a nossa?

O desempenho individual dos candidatos foi sofrível. Mas até aí morreu Neves. Não estamos num concurso de miss simpatia. O que me interessou foi a resposta àquela pergunta acima.

O candidato Mulim (PR), da oposição, disse que vai governar com as "verbas carimbadas". É pouco. São Gonçalo é uma criança que precisa de ajuda (federal e estadual) para aprender a andar sozinha. A sua proposta de subsidiar o transporte público é inviável. Campos pode fazer isso. É autossuficiente devido à grana dos royalties. Até ele sabe disso, e para sustentar sua proposta e fechar a conta, utilizou-se do discurso anti-corrupção. São R$ 157 milhões o custo anual para os cofres públicos com a passagem a R$ 1,50.

Adolfo Konder foi mais assertivo e puxou o debate para o mundo real. Claro, é ele que tem as parcerias e usou e abusou desse fato como principal estratégia argumentativa para convencer o eleitor, sobretudo o eleitor indeciso. E acho que convenceu.    

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

O PESO DAS ALIANÇAS EM SÃO GONÇALO

Amigo (e)leitor. Dia 28 é logo ali e a chapa esquenta. A peleja entre Konder e Mulim entra em sua fase final neste 2º turno e deixa clara pra gente os dois campos em disputa pela prefeitura.

Adolfo Konder (PDT), que no início da campanha era um ilustre desconhecido, segurou firme o timão e conseguiu chegar ao final do 1º turno com uma bela (e consolidada) vantagem frente aos seus concorrentes. Isso demonstra confiança da torcida pela equipe comandada pela professora Maria Aparecida desde 2005. A campanha de Adolfo Konder tinha três objetivos: óbvio, torná-lo conhecido ao eleitorado, colar à sua imagem à prefeita e ao seu bem avaliado governo e expor a necessidade de parcerias políticas para o desenvolvimento da pobre e sofrida cidade de São Gonçalo. Os quase 42% de preferência do eleitorado no 1º turno à candidatura Konder mostrou eficiência da estratégia pedetista.

Já a candidatura Neilton Mulim (PR), que chegou à frente de Graça Matos (PMDB) com pouco mais de 3 mil votos, montou uma chapa conservadora à direita, reunindo tucanos e demos, e precisou correr atrás do apoio da candidata derrotada para se manter competitivo na disputa. Por conta da presença de Anthony Garotinho em sua campanha, que impossibilitou o apoio do PMDB, sobrou para Mulin o apoio do PV, que saiu enfraquecido das eleições, e o apoio do grupo político do vereador e presidente da Câmara Eduardo Gordo, que congrega 11 parlamentares dentre os da atual legislatura e os marinheiros de primeira viagem.

Neste quadro, Adolfo Konder sai beneficiado porque não foi obrigado a mudar os rumos de sua estratégia do 1º turno. Pelo contrário. Os apoios do PMDB e do PP aprofundam a estratégia das parcerias, em que as maiores estrelas agora são o governador Sérgio Cabral e o senador Francisco Dornelles. Konder, que já tinha o apoio dos senadores Lindbergh e Crivela, além do apoio do governo federal,  fecha o arco de alianças e isola o adversário numa trincheira política que não se mostrou eficiente no 1º turno, que foi explorar o fato de Konder não ser natural de uma cidade onde 70% de sua população também não o é. O slogan Não Voto em Forasteiro definitivamente não funcionou.

Por força das circunstâncias, a candidatura do PR foi obrigada a fazer um ajuste na rota ao abrigar o grupo do vereador Eduardo Gordo em sua campanha e num hipotético governo. A notícia desta aliança não está sendo digerida com facilidade por uma parcela do eleitorado, que identifica em Eduardo Gordo o fisiologismo e tradicionalismo políticos tão praticados e cada vez mais rejeitados. Haja vista a renovação espetacular de 80% dos vereadores nesta eleição, e a própria queda da votação de Eduardo Gordo - que teve a sua candidatura impugnada pelo TRE sob a Lei da Ficha Limpa, mas espera julgamento do recurso no TSE.

Este apoio, portanto, deve ter um impacto mais negativo que positivo na campanha Mulim, sobretudo nos votos das camadas médias da sociedade gonçalense que migravam naturalmente para a sua candidatura após as derrotas de seus candidatos no 1º turno. A tendência, a partir de agora, é a escolha pelo voto nulo ou abstenção. Ou até o voto útil na candidatura Konder, porém em menor escala, para barrar a ameaça de vitória da política fisiologista e tradicionalista em São Gonçalo. Mulim deu um tiro no pé e, ironicamente, pode perder a eleição justamente por conta do apoio de políticos tradicionais da cidade.


terça-feira, 16 de outubro de 2012

SÃO GONÇALO É O PARAÍSO DA OPOSIÇÃO

Meu nobre leitor, São Gonçalo é uma cidade enorme, ficou anos abandonada e por isso mesmo acumulou índices de desenvolvimento humano perversos. Aqui nesta freguesia, portanto, é mamão com açúcar o discurso da oposição colar num ouvido incauto.

Porém, permita-me fazer uma breve narrativa euclidiana acerca de tal geografia citadina à leste da província de São Sebastião do Rio de Janeiro, banhada pelo esgoto industrial que chamam Guanabara e fronteiriça à Praia Grande e às terras do Barão de Maricá e do Visconde.

A freguesia de São Gonçalo do Amarante possui pouco mais de 256 km² de terras quase que totalmente ocupadas por 1 milhão e tantas almas. É a 2º mais populosa do estado e a 16ª do Brasil. Mas esses dados nos dão uma falsa noção de grandeza levando em consideração o orçamento nanico de R$ 670 milhões que obriga o administrador ser bom no rebolado fiscal e flertar permanentemente com outras instâncias do poder a fim de fechar as contas e satisfazer ao cada dia mais exigente (e impaciente) contribuinte gonçalense. Para se ter apenas ideia de uma cidade parecida (mesmo que de longe) com São Gonçalo, Guarulhos tem uma receita de mais de 2 bilhões de reais por ano.

Fazendo uma matemática rudimentar, se distribuirmos o nosso quinhão pelas almas desta freguesia, teremos R$ 67,00 por cabeça. E se levarmos em consideração que 53% da "fortuna" arrecadada vai para o funcionalismo, restam pouco mais de 30 reais per capita gastos por ano com nossas crianças e velhos, tanto em educação e em saúde; pavimentação, manutenção dos semáforos etc, etc. e põe etc nisso. Daí, meu perplexo leitor, a nossa inevitável dependência aos cofres da União e do estado, tanto em repasses por força de lei como por força do entendimento e boa vontade políticos. Somos a cidade no Brasil que mais depende das voltas que a política dá para fazermos alguma coisa que não seja choramingar com pires na mão.

Por obra e graça dos gênios da raça papa-goiaba dos anos 50 e 60 do passado século XX, a freguesia foi incapaz de planejar o seu futuro a longo prazo, além de permitir o seu inchaço pelas franjas do município, de modo omisso e criminoso, seja pelos inacreditáveis loteamentos ou pela posse irregular de terras públicas em áreas de mangue às margens, da também mal planejada, BR 101. Some-se a isso o esvaziamento industrial sob o olhar impassível da rapaziada que ora residia à Feliciano Sodré, Nº 100, representação maior de nossa municipalidade.

Bem-quisto leitor. Sabes que te amo e em verdade vos digo: São Gonçalo é um problema. Ela não tem problemas. Ela mesma é o problema. Lamento dizer que aqui neste pedacinho de céu e terra de pipa e bola de gude da minha infância, foi-nos reservado indignação, sofrimento e resignação. Sim, porque durante muitos anos ficamos reféns de uma trama diabólica que nos empurrou para a periferia da periferia; uma trama que nos legou como depositório de gente, um lugar onde apenas permitido construir pracinhas sem coreto, que ao menos nos servisse de púlpito a levantar nossa voz contra aquele estado de coisas tão afeito à viralatice papa-goiaba que deixou imerso nas sombras o futuro desta cidade. Oxalá conosco estivesse o maior de todos os não-gonçalenses, Luiz Palmier, mas este aí morreu tristonho, creio, ao ver tanta patacoada.

Para uma parcela considerável de São Gonçalo, nada que se faça se corrige. É o melhor lugar para se fazer estágio oposicionista. Todos aqui são oposição. Ser de oposição nestas terras é quase um nirvana, uma catarse, que atinge até o mais fervoroso defensor do governo. Qualquer governo. Há uma expressão (e se não há, eu assumo a autoria) que fazer alguma coisa de bom por essas bandas é como esvaziar açude cheio com cumbuca rasa. Ninguém nunca vê o resultado. Os problemas são tantos e vários, que o governo tem que se policiar pra não esculhambar e fazer oposição a si mesmo também.

Então, leitor, peço serenidade e juízo no dia 28 de outubro do ano de Nosso Senhor de 2012.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

PRA ONDE VÃO OS VOTOS DO JOSEMAR?

Neguim arretado

Primeiro, leitor, quero deixar o registro e os parabéns aos trepidantes militantes do PSOL gonçalense. E claro, em especial, ao Professor Josemar Carvalho, um querido colega e amigo. Conquistar os 19,5 mil votos com uma estrutura pequena de campanha numa cidade enorme como São Gonçalo é uma hercúlea tarefa.

Feito, aqui, o devido cafuné na rapaziada, vamos ao que interessa.

Pra onde vai esse capital (ops!) de quase 20 mil almas obtido por socialistas e comunistas no último dia 7 de outubro? Qual candidatura mais sentirá na face o sopro da primavera psolista, cantada em prosa e verso a partir do Rio de Janeiro com o gonçalense Marcelo Freixo?

Este escriba arrisca alguns palpites. Todos sabemos que o PSOL é uma dissidência do PT surgido após as tensões internas por obra e graça do (bendito ou famigerado, aí é ao gosto do freguês) escândalo do mensalão. Tanto Freixo quanto Josemar têm suas origens no Partido dos Trabalhadores. Ambos são fortemente guiados por suas convicções ideológicas e práticas políticas da esquerda socialista. Portanto, arrisco-me a dizer que é impossível o Professor Josemar apoiar o candidato de centro-direita Neilton Mulim, que tem o tonitroante Pastor Malafaia como aliado, cabo eleitoral e guia espiritual.

E, embora a candidatura Konder esteja num campo ideológico mais à esquerda, também não acredito que Josemar se decidirá em marchar com o PDT (que tem o PT como vice) no segundo turno. Por uma necessidade tática para obter votos, o PSOL foi o que mais bateu na gestão Aparecida e, consequentemente, em Adolfo Konder. Desta feita, creio que Josemar irá se abster no 2º turno. Mas, e os seus eleitores?

Divido os eleitores do PSOL nessas eleições em três categorias, em sua grande maioria jovens: os ideológicos, os ideológicos-inconformados e os pura e simplesmente inconformados. Os primeiros têm uma visão política mais ampla porque mais participativa, são informados e tendem a votar no campo da esquerda para isolar a direita na cidade. Os segundos são ativistas partidários que, por conta da visibilidade social e política na campanha, tendem a ter postura mais radical e pregar - não necessariamente votar - no voto nulo. Os terceiros desde o início serviram de linhas auxiliares das campanhas Graça e Mulim de ataque a Konder, utilizando-se e reforçando a linha de ataque promovida pelo PSOL ao governo e à candidatura de sua continuidade. Sempre foram, no fundo, mais anti-Konder do que qualquer outra coisa.

Na minha visão os votos ficarão divididos entre Konder, nulos e Mulim, com uma sensível vantagem para Konder.

Atualizando: veja nota do Professor Josemar que saiu no dia seguinte a esse post aqui.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

O QUE OS ANALISTAS DE SG INSISTEM EM NÃO VER

Meu caríssimo cidadão leitor-leitor cidadão. Sei que estamos um tanto de ressaca após domingo, mas aproveito ainda o calor eleitoral do dia 7 de outubro para fazer algumas observações deveras pertinentes na visão deste humilde escriba.

A grande vencedora, de novo, foi a prefeita Aparecida Panisset. A grande derrotada foi Graça Matos, que disputou a sua última eleição em São Gonçalo. Não dá mais para ela e o seu grupo. Aliás, não dá mais desde 2004, mas a miopia política dos seus correligionários a fizeram acreditar no contrário. Poucos políticos compreendem o espírito do seu tempo, o que não é, definitivamente, o caso de Graça Matos, que tem, outrossim, uma grande presença parlamentar. Mas isso, por si só, é insuficiente para agregar forças para vencer uma eleição majoritária que necessita de base social representativa e atuante, sobretudo numa cidade difícil e dispersa como São Gonçalo.

Graça e o seu grupo ainda estão presos à forma de fazer política do século passado e ao erro original por ter abraçado os interesses pessoais de Garotinho e abandonado o PDT e o velho Brizola. E olha as voltas que o mundo dá: no dia 28 próximo, muito provavelmente, os eleitores reconduzirão o PDT ao poder máximo da municipalidade gonçalense. Aparecida Panisset, sem espaço no partido nos anos de 1990 - quando era dominado pelo casal Matos -, correu esse mundão de meu Deus até desembarcar novamente no PDT em 2007... Irônico? Pode ser.

Usando da sua melhor virtude, a perspicácia, Aparecida procurou sepultar de vez a forma tradicional de se fazer política em São Gonçalo, atendendo à ordem expressa pelos gonçalenses em 2004 (Para entender melhor o que eu falo, clique aqui). O motivo das maiores críticas contra ela na verdade se mostrou o seu maior acerto: trazer gente nova para o seu governo, mesmo de fora da cidade. Antônio Moreno, meu conterrâneo da Tijuca, se mostrou um ótimo administrador das finanças da cidade. E Adolfo Konder, nascido na ensolarada Ipanema, desde 2005 vem se destacando como bom gestor das áreas política, social e do desenvolvimento econômico do governo. Se assim não fosse, seria devorado pelas intrigas e futricas internas que desde 2011 buscou demover da cabeça da prefeita a sua escolha para sucedê-la.

Por essas e outras é que a pecha de forasteiro em cima do Konder não pegou e nem vai pegar. Aliás, é uma afronta, e mesmo uma ofensa à grande massa de migrantes que em São Gonçalo se estabeleceu. É uma bobagem bairrista e provinciana em pleno século 21. Adolfo Konder, um ilustre desconhecido até essas eleições, ficou a 8 pontos da vitória ainda em primeiro turno (teve 42%), a despeito de sua fama de ser um candidato sem, vá lá!, muito carisma. Ele chegou onde chegou porque simplesmente as candidaturas, tanto da Graça, quanto do Neilton Mulin, representam o que já foi testado misturado ao velho tradicionalismo, sendo assim, uma incongruência política com o que foi montado por Aparecida em 2004.

A única candidatura apoiada ou encabeçada pelo PMDB do governador Sérgio Cabral que não venceu, ou que não está no segundo turno no Grande Rio, foi a da Graça. Portanto, é uma falácia e uma desonestidade intelectual não reconhecer que a grande responsável pela derrota foi a própria candidata que fez costuras políticas e eleitorais anacrônicas com o momento político da cidade. A reunião das famílias Matos, Gordo e Nanci, afiançada pelo ex-deputado Jorge Picciani foi bem didática para confirmar o que digo: São Gonçalo mudou, e não quer mais se fazer representar por esse grupo, que se ainda se prevalece de alguma relevância eleitoral localizada, não possui mais - pelo menos nas urnas - legitimidade para conduzir política e administrativamente São Gonçalo.

Também não acredito que a candidatura Mulin, que é uma composição de centro-direita, apoiada pelo enfraquecido Garotinho, vença as eleições. Por uma razão muito simples, dentre as que já foram expostas aqui: o alinhamento óbvio do PMDB estadual com o PDT, além de vermos um apoio maciço de pelo menos 70% dos vereadores eleitos à candidatura Konder, o que provavelmente deve derrubar a cidadela eleitoral de Neilton Mulin, a 132ª Zona Eleitoral, única onde o candidato bateu Adolfo no primeiro turno.

Meu caro leitor, deixo uma matéria bacana do JB para ajudar a enriquecer o debate, clique aqui.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

ÀS URNAS, GONÇALENSES!

Ele entendeu o zeitgeist gonçalense


Querido leitor e leitora deste blog. No dia sete de outubro do Ano de Nosso Senhor de 2012 voltaremos às urnas para eleger o futuro mandatário desta cidade e seus 27 parlamentares.

Novamente esta freguesia do beato boêmio não mereceu a devida atenção da mídia nativa e muito menos da capital da província. Fomos solenemente ignorados nos levantamentos eleitorais tradicionalmente produzidos nesta época pelos institutos de pesquisa a pedido das empresas de comunicação, o que nos deixa sem parâmetros objetivos para analisarmos "frame-a-frame" o pleito e as tendências de voto do eleitorado.

Portanto, abnegado leitor, tentarei fazer um levantamento político-partidário das três principais alianças em disputa formadas na cidade e que, em minha humilde visão, têm chances de vitória. São elas: Konder/Miguel, Graça/Rafael do Gordo e Mulim/Valviesse.

Falar da candidatura Konder é ter que falar necessariamente no governo da atual prefeita Aparecida Panisset, já que o candidato representa, grosso modo, a continuidade de um modelo de gestão posto à prova desde 2005, do qual passa por um referendo popular em 2008, quando os eleitores reconduziram a prefeita ao cargo por mais quatro anos ainda no primeiro turno com 56% dos votos válidos naquela ocasião.

Assim, peço a você fazer uma breve digressão sobre o que foi este governo que sempre teve em Adolfo Konder uma das principais figuras que o compuseram desde o primeiro dia daquele janeiro de 2005, fazendo com que muitos analistas políticos vestissem o pijama mais cedo sobre um colchão duro e errático de suas análises.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

ELE VEIO DE LONGE SÓ PRA LHE PEGAR...




“Raul Seixas e Raulzito/Sempre foram o mermo homi/mas pra aprendê o jogo dos rato/Transou cum deus e cum o lobisomi.” 

Assisti, com mi amore, - como quem ainda roça a brevidade do tempo - no pomposo e lendário Cine Odeom-Petrobras, localizado no Largo histórico da Capital da Província, a Cinelândia, ao maravilhoso documentário  “O início, o fim e o meio”, do diretor Walter Carvalho, que narra a impressionante história do maluco mais coerente já nascido nas terras da Bahia de Todos os Santos.

O homi, divino e pagão; humano, pertubadoramente humano e, por isso mesmo, cheio de contradições, reensinou a este humilde escriba a miséria da existência que teima em subexistir num ambiente hipócrita que premia prioritariamente os canalhas nesse teatro escroto donde o roteiro é a eterna variação sobre o tema de nossas ilusões passageiras e cheias de dentes brancos e saudáveis como num comercial da Colgate.

Escrever sobre o Raul é uma missão inglória acerca do mapeamento das coisas, a dimensão do homem. Como ser ao mesmo tempo o gozo e o seu anticlímax? E só mesmo a ironia para harmonizar tais extremos através da arte, pelo olhar do gênio Raul Seixas. Nenhum outro artista brasileiro conseguiu levar para sua música questões tão complexas de nossa finitude humana e transformá-las em hit, sejam em canções proto-gospel e místicas como Tente Outra Vez e Gita, políticas, representadas em Sociedade Alternativa e Aluga-se, até as existenciais, na auto-declaração Eu Sou Egoísta, na ultraclássica Metamorfose Ambulante e no hino da desilusão Ouro de Tolo.

Raulzito foi muito importante na formação deste escriba, para o bem e para-além o mal. Aliás, experimentei com ele esta deliciosa ambiguidade, dualidade do viver e do aprender. Espantei, ali, qualquer possibilidade de ser conduzido por esse troço maniqueísta de ser. Portanto, me tornei, assim, meio baiano também.

Amando o contraditório nas coisas sem enxergar, necessariamente nisso um paradoxo. Em suas palavras, aos 11 anos de idade também já desconfiava da verdade absoluta.

E, programadores destas salas daqui desta freguesia, adoro a capital da província, mas, por favor: Toca Rauuuulll!

sábado, 22 de setembro de 2012

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

TRÂNSITO DE SG À BEIRA DE UM COLAPSO

Prefeitura reprimiu estacionamento irregular visando ordenar o trânsito em São Gonçalo. Resultado: protestos


Trafegar pela pela cidade está cada vez mais difícil. Avenidas centrais de São Gonçalo já dão sinais nítidos de saturação e estão próximas de um verdadeiro colapso. Ruas como Feliciano Sodré e Presidente Kennedy, que ligam o Centro à Niterói e à Alcântara, tiram a paciência de motoristas e usuários do transporte coletivo nos horários de pico do início da manhã e fim da tarde.

Outra via em situação crítica é a RJ 106 no trecho de Alcântara. A situação promete ficar ainda pior depois da inauguração de dois empreendimentos de grande porte na Av. Maricá, o supermercado Guanabra e um novo shopping, além do novo fórum, a ser construído no Colubandê.

Segundo o urbanista e geógrafo Mauricio Mendes, a prefeitura não está fazendo o seu dever de casa antes de liberar esses novos empreendimentos. “São Gonçalo sofre de um mal crônico de falta de planejamento viário. A prefeitura nada ou pouco fez para mudar essa realidade produzida no passado. O desenvolvimento econômico e o aumento da frota de veículos tendem a estrangular ainda mais o sistema”, disse Mendes.

O número de emplacamentos em São Gonçalo de 2002 até 2011 teve uma aumento de 150%, passando de 90 para 205 mil veículos que disputam espaço em ruas estreitas da cidade, muitas delas tendo a sinalização desrespeitada nas vias intermediárias, o que resultou, recentemente, numa grande operação de repressão pela Secretaria de Transportes, que adotou como estratégia de ordenamento do trânsito o reboque dos carros estacionados de modo irregular. Atualmente, a operação batizada de Calçadas Livres está parada devido aos protestos dos motoristas que reclamam de falta de informação através da prefeitura.

Ainda segundo Mendes, a prefeitura deve racionalizar o trânsito a partir de intervenções inteligentes, combate ao estacionamento irregular, além de construir um “arco viário suspenso” na região do Alcântara ligando as ruas Alfredo Becker, Maricá e a RJ 104. Mauricio Mendes lembra ainda que é necessário pressionar politicamente os governos federal e estadual pela construção do terminal das Barcas e do Metrô, fundamentais para aliviar o fluxo de veículos tanto para Niterói quanto para Itaboraí.  

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

QUEM SERÁ O PREFEITO DESTA FREGUESIA?

Sete candidatos disputam esta trepidante corrida rumo ao nº 100 da Feliciano Sodré. Façam suas apostas


Sete de Outubro é logo ali e todos os candidatos a prefeito procuram se acomodar nas dependências da prefeitura à Rua Feliciano Sodré, 100, como governantes desta cidade que é grande em população, mas ainda nanica no que se refere ao índice de desenvolvimento humano (IDH) do estado, embora, frise-se, venha melhorando nos últimos anos em indicadores importantes, como educação, saneamento e emprego.

Em 2012 sete candidatos concorrem à prefeitura, desde 2005 ocupada por Aparecida Panisset, que se esforça em deixar o seu legado ao ex-secretário de Desenvolvimento Econômico, Adolfo Konder (PDT).

Contra Konder, disputam o deputado federal Neilton Mulim (PR), a ex-secretária de Cultura, Alice Tamborindeguy (PP), o Professor Josemar (PSOL), Mauro Sérgio (PHS), Dayse Oliveira (PSTU) e Graça Matos (PMDB), que concorrerá pela 3ª e, talvez, última vez, buscando superar o trauma de duas derrotas consecutivas para a atual prefeita.

TRANSFORMAÇÕES NA CIDADE JÁ SE REFLETEM NA POLÍTICA

A Classe C é um fenômeno brasileiro que tem alavancado o consumo e os índices econômicos do país. Isso é um fato, porém simplista se não enxergarmos todas as transformações sociais, culturais e políticas que decorrem da melhoria de vida e de renda destas pessoas a partir de 2004 sob a batuta do presidente Lula, que optou pela inclusão social como mola mestra do desenvolvimento a partir do fortalecimento e crescimento do mercado interno. 


O vereador Marlos Costa (centro) quebrou o paradigma político histórico de orientação assistencialista na Câmara de Vereadores em São Gonçalo se aproximando de intelectuais, do funcionalismo público e da juventude gonçalense. Ligado aos movimentos de base da Igreja Católica, conseguiu dar visibilidade política a este segmento novamente numa cidade onde os evangélicos têm grande influência e peso decisório

Essa política de desenvolvimento acertou em cheio a cidade de São Gonçalo, hoje habitada em sua grande maioria por pessoas da Classe C, com renda percapita entre R$ 300 e R$ 1.000. Atualmente, muitos estudiosos usam o município, inclusive, como estudo de caso para o que está acontecendo com o resto do país.

Um conjunto de  injunções econômicas resgatou a tradição industrial gonçalense a partir do renascimento da indústria naval e dos investimentos da indústria do petróleo com o Comperj. Os empregos voltaram para a cidade e incrementaram o surgimento de novos postos de trabalho na área de serviços com pelo menos 4 grandes empreedimentos de grande porte.

O acesso à renda viabiliza o acesso à cidadania em todas as suas dimensões, sobretudo política, antes amarrada a uma teia assistencialista que sobrevive apenas em meio à pobreza e à falta de perspectiva.

Um exemplo claro destas mudanças que ocorrem na cidade foi a eleição do vereador Marlos Costa, 37, em 2008. Ele que é de Alcântara, também é oriundo desta mesma Classe C, e conseguiu ascensão social através da educação (é advogado formado pela UFRJ e auditor do TCE). Filiado ao PT, é considerado o primeiro político de “opinião” eleito depois de muitos anos em São Gonçalo, diferentemente de seus colegas na Câmara, identificados ao assistencialismo e ao poder econômico quase sempre decisivos nos resultados das urnas.

A sua origem social e a forte consciência de classe foram facilitadores naturais para que se aproximasse das questões ligadas à educação, cultura e ao funcionalismo público municipal através do sindicato da categoria, que atualmente trabalha por sua reeleição. Outro fator representantivo surge de seus esforços pela modernização da administração pública, que resultaram em dezenas de audiências públicas com o executivo e leis visando a racionalização e desburocratização das relações entre prefeitura e sociedade.

O vereador Marlos é o maior representante desta nova classe média gonçalense, emancipada e ávida por melhorias concretas em sua qualidade de vida, além de ser postulante real ao cargo máximo da municipalidade. Isso, é claro, se o seu partido tiver juízo e abrir caminho para a sua maior estrela em São Gonçalo.




AS DORES DE CRESCIMENTO DE UMA CIDADE CHAMADA SÃO GONÇALO

Olá amigo leitor. Como sabemos, a freguesia de São Gonçalo do Amarante completará 122 anos de autonomia político-administrativa no dia 22 de setembro do ano de Nosso Senhor de 2012.

Este humilde escriba contribui para a compreensão desta cidade postando um especial com algumas observações sobre diversos temas que vão desde história, urbanismo, política e economia.

Boa leitura.

Imagem icônica de São Gonçalo: Igreja Matriz, no Bairro Zé Garoto, bem no centro de São Gonçalo


George Savalla, o nosso eterno Palhaço Carequinha, e Altay Veloso, músico e compositor de primeiríssima, são os nossos maiores ícones nativos da cultura nacional. Os dois ainda guardam semelhanças afetivas às terras de Gonçalo Gonçalves, colonizador português que batizou essas bandas ao leste da Capitania de São Sebastião do Rio de Janeiro com o nome de São Gonçalo do Amarante, beato católico transformado em santo protetor de todos os artistas e boêmios.

Tanto Savalla quanto Altay afirmaram jamais abandonar a cidade. O primeiro, morto em 2006 em sua casa, no bairro Zé Garoto, aos 90 anos, cumpriu a sua promessa de ser enterrado no cemitério de São Gonçalo, a poucos metros de onde morava. Já Altay Veloso, um dos maiores compositores da música popular brasileira, permanece no mesmo lugar aonde nasceu, no bairro Porto da Pedra. “Não vejo motivo para sair da cidade, mesmo com tantos problemas”, disse ao Apologia em 2008 o autor da ópera O Alabê de Jerusalém e tantos outros sucessos e pérolas do cancioneiro interpretados por artistas como Alcione, Emilio Santiago e Roberto Carlos.

São Gonçalo, município oficialmente criado em fins do século XIX, só assegurou plenamente a sua autonomia em 1930 ajudado pelos ventos da revolução que promoveu um rearranjo político-institucional no país, que alçou ao poder da república o gaúcho Getúlio Vargas. A cidade, que basicamente se resumia ao distrito de Neves em sua parcela mais urbana,  viveu a sua glória entre as décadas posteriores de 40 e 60, quando nessa mesma região até o Barreto foi erguido o maior complexo industrial do antigo estado do Rio de Janeiro.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

O SAPATO DE JULIETTE - LAUDA VIII

(...)

Ele já sabia ser um ilegítimo Ferro Lemos desde a briga de braço com o irmão dito postiço; este, aí sim, Ferro Lemos legítimo. Mesmo antes, sua mente inventiva já dera sinais de sagacidade. Próximo ao seu oitavo aniversário criou-se um germe de dúvida em sua cabecinha, de quem ele era ali naquela família. Um dos seus irmãos também faria a mesma idade - exatamente oito anos - apenas três meses após o seu próprio. O vivo garoto andava a observar toda sorte de bicho emprenhado; o fascinava as tetas grandes, o bucho crescido e os seus diferentes tempos de gestação. Como a aritmética jazia no saber para frente, contava o tempo pelas estações. Ele se intrigava sobremaneira com as galinhas; mas só com as galinhas. Sabia existir o tempo certinho das frutas, dos bezerros, dos cachorros e das gentes iguais a ele. A estas, contava três estações, nunca mais nem muito menos que isso. Como que diabos o seu irmão nascera apenas depois de uma mísera estação? Será por isso ser ele tão especial, ganhador fátuo de tantos e mais presentes e festas?

Mistério até o dia da primeira e grande revelação de sua vida pequena e por demais difusa. Não sabia de nada dessas coisas de sangue, de diferenças de gostar, do afeto. Passava longe dele este tipo de corrupção humana. Havia era a brincadeira de corda e engenho, o balanço do quintal e a atenção de dona Teresa, feito mucama mameluca da família; sua protetora. É, J. Carlos passava a noite em seu quarto miúdo de empregados, sendo, por vezes, confundido pela gente de fora que o achava, ele próprio, um agregado da casa. Idêntico à condição jurídica dos que nada tem. Mas não importava, não: compensava o cafuné...

_ Juliette, como está a situação entre os seus? - perguntou Mirandinha, já sabendo da resposta.
_ Uma merda! - respondeu assim a menina, o que fê-la ouvir, imediatamente, uma reprimenda da velha:
_ Olha, estou intimando-a a conversar comigo em hora mais apropriada. Vejo que necessitas de uma boa e proveitosa conversa - disse, mirando-a nos olhos. - Pode ser amanhã pela manhã? Prepararei um delicioso almoço pra gente, que tal? Agora, devo saber quanto calça.

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segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

O SAPATO DE JULIETTE - LAUDA VII

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Porém, num final de tarde, ouve-se uma confissão inesperada e translúcida daquele homem: - Eu fui o sujeito que mandou sua mãe e seu pai pro outro mundo - disse, inacreditavelmente calmo, enrolando o seu cigarro de palha. Os dois estavam de pé a caminho de um sitiozinho nos arredores de João Pessoa, de propriedade da família, onde buscavam, uma vez por semana, frutas e hortaliças para abastecer a casa. - Você era pra morrer junto deles - soltou, sem perceber que já falava sozinho pela rua de barro úmido. J. Carlos parara de andar ao seu lado; e ficara, no meio da estrada, perplexo e confuso, fazendo-se ausente daquele diálogo macabro.

J. Carlos não compreende, mesmo depois de tantos anos, aquela atitude do jagunço Quinzinho. Certo o assassínio deste homem duas semanas após a incongruente declaração. Assassinato de emboscada, quatro punhaladas fatais em uma casa de moças desclassificadas de João Pessoa. J. Carlos somente lembrara do sujeito ainda mais sinistro por aqueles dias, ainda mais quieto, a olhá-lo de banda, querendo com ele alguma coisa, dizer algo. Não deu, por sua vez, a devida importância àquele jeito soturno, até porque essas coisas são meras especulações a posteriori... e a coisa maluca: a inocente caminhada a pegar frutinhas no pomar deu em quê. Os quês de vários porquês levaram J. Carlos à Marinha de Guerra do Brasil. Poderia ter escolhido a Legião Estrangeira como desterro, mas mesmo no deserto haveria de fincar raízes, o que seria contraproducente à sua história que, quando é teimosa, transforma-se em sina.

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quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

O SAPATO DE JULIETTE - LAUDA VI

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Ora, mas quem precipitou-se foi eu. Devo puxar a linha deste carretel com discernimento para não dá-la nós. Que seja o último!

Como disse, o homem nascera em algum lugar, chegando à família Ferro Lemos ainda de colo. Um sujeito sinistro, de alcunha Quinzinho, tratou de entregá-lo à mãe oportuna na cidade de João Pessoa, em sua parte mais abastada. Este episódio teima em ser deveras tenebroso à cabeça do infeliz, feito fantasma que assombra em horas de tutela. E tal espectro materializou-se por obra deste mesmo sinistro sujeito, em um dia quente qualquer do nordeste deste ponto do universo que rima com o mais vil palavrão.

Os anos deram à família Ferro Lemos prestígio e terras naquelas bandas da Paraíba e alhures. O controle dos seus negócios e os investimentos eram feitos com mão de ferro, foice, facão e espingarda; a faceta original do capitalismo brasileiro. O cancioneiro estava por fazer Asa Branca, era latente como um escândalo. Os conchavos e os acordos entre os iguais localizava-os na civilização, mas de modo algum pode-se dizer prática dominante daquelas cercanias. As birras e os negócios pendentes eram resolvidos à bala e sangue, o braço político usual dos coronéis e senhorios da tradição patriarcal conservada e reformada. Sofria menos quem tinha mais, e, o inverso, era a tilintante crueldade em forma pura, de uma atroz infalibilidade.

Quinzinho era um sujeito sinistro. Precisava sê-lo. Não sei se daria a ti descrição fidedigna da sua obliquidade. Tinha na sua esquisitice algo de etéreo e transcendente. A sua função neste mundo era de uma predeterminação quase litúrgica. A magreza do sujeito servia-lhe como testemunho da secura de sua alma. Os olhos fundos e sua testa protuberante faziam-lho estranho contraste com aquele quase-corpo. Mas J. Carlos não terminaria aqui a sua descrição: os gestos do sujeito eram de uma economia que tornavam explícito o seu talento moco. Quinzinho era o filho torto daquela Paraíba, mas o serviçal perfeito da família Ferro Lemos. Não havia em Quinzinho moralidade ou imoralidade, culpa - nada! Não em sua cabeça, nos seus atos. Simplesmente ele eliminara tais conceitos e complexidades. Era de uma leveza insuportável. Falava pouco, jamais repetia o já pronunciado; a voz do sujeito era para si próprio uma anti-inflexão.

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quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

O SAPATO DE JULIETTE - LAUDA V

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_ É com tudo e com todos. Sabe, as coisas comigo dão tão errado, que duvido realmente existir - Depois de uma pesada, dramática e terrível pausa, continuou: Uma vez li - não sei onde - que tudo que existe é, ao mesmo tempo, potência e resistência porque é força, e, no entanto, cá estou em sua casa bebendo esta água doce - filosofou a moça com a reflexão dos derrotados.

Juliette sempre soube da dureza da vida; agora, o parênteses necessário: creio que o leitor possa ter uma compreensão coberta pela áurea da pieguice a respeito de concepção e afirmação consumidas pela desesperança generalizada. Porém, diria ser a sua vida, em particular, um arroio de mequetrefe. Para ela, os seus impedimentos eram rudes e intranscendentes. A única coisa que tinha em seu favor era o intelecto, talvez -faça ver! - por herança de seu pai e de sua mãe. Peço licença, portanto, para contar-lhe um pouco da história dos seus ascendentes num brevíssimo prólogo.

Os dois conheceram-se lá pelo fim da década de ouro do Brasil. Sim, nos anos cinquenta do passado século XX. Ele, cabo da Marinha de Guerra, e ela, filha de um funcionário público de pequeno escalão do Ministério do Planejamento. Um pouco de atenção à história brasileira nos daria o cenário perfeito ao encontro do casal. Por hora, comecemos a genealogia.

O homem, pai da moça, fora batizado João Carlos; João Carlos de Ferro Lemos. Nascera em 1939 numa cidade do interior do grande Estado do Sertão. Digo numa cidade, porque mesmo ele a ignora. Sem o querer, mergulharia de cabeça no turbilhão de eventos sucessivos que culminariam no seu mais completo esquecimento como pessoa à ruazinha das Flores; em uma pseudo-cidade de subúrbio do Rio de Janeiro, ironicamente afeita à sua condição. Parou ali como sempre vivera, tal como folha vadia ao sabor dos ventos, que se desgarra, murcha e finalmente seca para desintegrar-se. Talvez para ele a sua própria vida tenha sido uma enorme pilhéria. Ainda não cansara das perguntas que fazia a si mesmo - por sua vez -, mas há muito desistira de lutar no front da vida. Tombara em meio ao combate pela existência neste mundo deveras hostil. Juliette daria, então, continuidade à causa perdida? Bem veja que é cedo para tirarmos qualquer conclusão, uma antecipação que seja é precipitada.

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terça-feira, 17 de janeiro de 2012

O SAPATO DE JULIETTE - LAUDA IV

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Outros que saíam de suas casas para o trabalho tiveram as atenções voltadas para aquele trecho de rua. Os que iam à frente seguiram os seus destinos com chances sérias de terem mau jeito no pescoço. Os que haviam de passar, diminuíam os passos. Os chegados a uma ou outra paravam para acudir. - Vão, por favor, vão! - dizia a velha, percebendo a antropofagia da pueril curiosidade transeunte. De mais, ela mesma queria desvendar o mistério. Para tanto, a pegou pelo braço perguntando em sussurro:

_ Queres vir a minha casa?
_ Qual o quê, dona Mirandinha! Vou entrar e descansar um pouco - disse a moça, desvencilhando-se da velha em direção à entrada de seu esconderijo.
_ Ora, mas não vais mesmo! - reagiu, pegando em seu braço; e, nesse gesto, desvelando certos ares de convicção, imperativa. - Venha comigo, e darei a ti café com leite quente e alguns biscoitos... não! água com açúcar se quiseres. Vejo que estás mais nervosa que lesa...

Esta última frase, junto ao sorriso da velha, cativaram-na, minando sua resistência. Lá entraram enfim.

E sentaram-se as duas à mesinha de madeira logo à entrada da cozinha. Bastou uma piscadela para surgir, entre a soleira da porta de mesmo cômodo seu Clodomiro, marido de Mirandinha. A velha logo adiantou-se: - Não foi nada! - despachando o velho desleixado e modorrento.

_ E então; conta-me o que houve? dando-lha água doce.
_ Este sapa... - Juliette não conseguiu completar a frase, interrompida por Mirandinha em corte:
_ Eu já sei que estes sapatos eram os únicos que tinhas para usar; claro está. É fácil de resolver, não se preocupe. Mas resolver o problema do calçado deixará outro em aberto, não é verdade?
_ Sim - seco.
_ Pois me conte. É algo com seu pai e sua mãe?

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segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

O SAPATO DE JULIETTE - LAUDA III

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Foi a velha claudicante a vítima eventual de sua dor. Juliette respirou fundo, contou até dez, desejou mesmo flagelar-se; tudo! para não descontar em dona Mirandinha tantos impropérios. A velha, por sua vez, fazia bem não ser com ela. Os muitos anos vividos deram-na ouvidos pacientes e compreensivos para com a juventude - especialmente com Juliette, por ela muito querida. Devo explicar que tal afeição não era em si gratuita. A moça fora morar à Rua das Flores ainda recém-nascida, enrolada com a manta que seria do seu irmão, caso este não sucumbisse aos caprichos do destino. A mãe e o pai de Juliette - que serão apresentados em boa hora - decidiram mudar-se depois do inesperado; contudo, pregam-lhes outra peça o destino quando mal superaram o terrível infanticídio: souberam de outra gravidez, esta que traria ao mundo a sua única filha Juliette.

Darei ao leitor amigo os detalhes desta história, o que nos ajudará sobremaneira entender os descaminhos da pobre moça. Por hora, acompanhemos o interessante desdobramento do diálogo interrompido pelo parágrafo acima obscuro:

_ Ora! calce outro e vá - disse a velha, certa da solução.
_ Eu não os tenho.
_ Eu não os tenho o quê? - pergunta a velha incrédula.
_ O sapato, o sapato! Eu não tenho sapato; ouviu?!! - Juliette levanta-se de súbito a girar e girar - loucamente -, fora de si:

_ Eu não tenho sapato! Eu não tenho sapato! - Gargalha de bazófia acompanha o triste saldo patético da cena as cinco e pouquinho da manhã de sexta-feira.

Eu não tenho sapatos. Eis o embuste que confunde o leitor desatento.

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sábado, 14 de janeiro de 2012

O SAPATO DE JULIETTE - LAUDA II

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Ainda lá estava a moça na solidão do desespero e sentimentos ruins há muito habituais à cabeça. Arrastou-se, porém, à borda do meio-fio a sentar-se. Ficou em tão funesta solidão até o ranger de uma portinhola à sua frente. Era dona Mirandinha mimando a insônia. Tão logo a viu chamou-a sem perceber-lhe o aviltamento da cena:

_ Juju, é você? É você Juju?!!

Dona Mirandinha já era vó há bastante tempo, e a artrite a perseguia. Nada que lhe tirasse a ternura. Absolutamente! Chamava-se Mirândola, mas a vizinhança tratou de alcunhá-la dona Mirandinha mesmo. Viste acima que chamara Juliette por duas vezes, e depois de um estranho silêncio perguntou em baixo tom, curiosa:

_ Que fazes aí minha filha?
_ Não é nada - respondeu sem olhá-la nos olhos; enxugando o que restava de lágrima na bochecha pálida. - Eu só estou aqui... - Não se aguentou; chorou de soluçar em tremedeira; gemia como criança pequena.

A mulher atravessa a rua do seu jeito, indo ao seu encontro. O franzir do rosto de Mirandinha - além de enrugá-lo - carregava pesada curiosidade: "O que essa menina aprontou dessa vez? Ora, mas tão cedo! Não, não... As luzes da sua casa estão apagadas; estão todos dormindo por certo". Pisava nos paralelepípedos indagando-se a fim de adivinhar a causa do inusitado em pleno alvorecer.

_ Aconteceu alguma coisa; fale comigo Juliette...
_ Aconteceu, sim! Eu não vou trabalhar hoje! Tudo por causa de uma merda de sapato!

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quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

O SAPATO DE JULIETTE

Juliette pôs os pés fora de sua humilde casinha à Rua das Flores. Era manhã cedo de mais um dia de trabalho num escritório de quinta da cidade. Com um suspiro de desagrado, parou à saída do portão enferrujado para fechá-lo e finalmente ir para a labuta obrigatória. Lépida, deixou a calçada de cimento liso e rachado não sem antes tropeçar no traiçoeiro meio-fio que fazia-lha o remate. Pronto! Soltara o primeiro palavrão do dia, embora o fizesse em desabafo. Não era a primeira vez que tal coisa embaraço trazia-lhe - bem o sabia ali. Desta feita, maior o estorvo. A travanca inesperada pareceu-lhe, a bem da verdade, um existencial vaticínio.

Refeito o equilíbrio do corpo, corre baixo os olhos que dariam à alma coisa bem pior portanto: a sola desgarrara-se do sapato. Ah! subiu-lhe à cabeça o sangue da raiva e do desespero. Em seguida - coitadinha - a dor pujante do abatimento moral. Era-lhe o calçado o único que não trazia-lhe vergonha nas andanças dos dias úteis.

Já entregue ao fato que a devorava os ossos e a deixava miúda e impotente, senta-se com a saia azul tergal à beira da rua de piso em pedra. Sem norte à frente, entrega, irreversivelmente, as pontas. E chora, baixinho, de cabeça baixa, antes mesmo o sol despontar-se no horizonte.

À vista primeira, parece a ti terrível acaso a pobre moça. Ei-lo que sim. Estás certo e digo: coisa assim boba do dia a dia ulula tragédia de sempre. Algo fê-la a grande dor da ruazinha de lá. Coisa maior que fatiga e cutuca a queda hedionda de alguém. Juliette, mirada pela literatura que a assiste, mesmo dirá a mim, porque ainda não sei-lo. Caso tão assim-assim delicado lembra-nos coisas de monta à vida sem pestanejo de dúvida. É deveras certo a identidade de quem sofre, ama e etecéteras - vejo que sabes. Impressionaria, por sua vez, a natureza ter feito corpo de homem e mulher desajeitado à perícia se não fosse o propósito. Ah, este propósito!

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FELIZ 2012...

Amigos leitores. Sei que estiveram ansiosos por notícias deste escriba. 

Pois bem. 

Tenho dois desafios. Um, é digitar um projeto de romance que jazia em um canto qualquer desta loucura de vida. E, o outro, é ir com a minha Kris Bella para a aprazível cidade de Assú, no Rio Grande do Norte, para, enfim, dar cabo desta missão.

Queria a ajuda e observação dos amigos, por favor.

Começarei em outro post. 

E vamo que vamo!